Análise de veneno de cobra revela potencial para tratar hipertensão

Pesquisadores do Instituto Butantan, em São Paulo, descobriram 30 moléculas a partir do mapeamento de peptídeos no veneno de três espécies de cobras – a Bothrops jararaca, a Bothrops cotiara e a Bothrops fonsecai.

Cinco desses peptídeos (compostos formados por aminoácidos e sintetizados por seres vivos) foram recriados em laboratório, passaram por testes em ratos e quatro deles apresentaram atividade anti-hipertensiva, o que dá a eles potencial para, no futuro, serem usados em medicamentos contra problemas de pressão arterial.

Os quatro peptídeos se somam a outros 13, entre os descobertos, que são da família dos potenciadores de bradicinina. Segundo a coordenadora do estudo, a pesquisadora Solange Maria de Toledo Serrano, do Instituto Butantan, este grupo de moléculas é conhecido há décadas por possuir efeitos sobre a pressão arterial. Pesquisas anteriores com peptídeos da mesma família deram origem a remédios contra a hipertensão – o primeiro deles a ser isolado do veneno da jararaca, nos anos 1960, levou à criação do remédio Captopril, por exemplo.

Análise profunda – “Fizemos uma análise profunda e extensa dos peptidomas [conjuntos de peptídeos] do veneno das três serpentes. Foi um estudo bioquímico de alto nível, do ponto de vista da complexidade do veneno”, diz a pesquisadora. As análises foram realizadas no Laboratório Especial de Toxinologia Aplicada, no Butantan.

Solange ressalta que o objetivo do estudo não foi descobrir novas moléculas, mas descrever a complexidade do conjunto de peptídeos no veneno das três espécies de animais.

A pesquisa, que foi publicada na edição de novembro da revista “Molecular & Cellular Proteomics”, é a mais profunda já realizada sobre peptidomas de veneno de serpentes, de acordo com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

No total, foram sequenciados 44 peptídeos, sendo que 30 eram desconhecidos. O estudo usou técnicas de bioinformática e de espectrometria de massas, método científico que identifica elementos que compõem uma substância e ajuda a obter informações sobre a estrutura de moléculas.

Uma das dificuldades foi fazer o sequenciamento dos peptídeos, já que faltam informações sobre a genética das serpentes e as cadeias de aminoácidos que compõem os peptídeos e proteínas destes animais.

“Como não se conhece o genoma completo de nenhuma espécie de serpente venenosa no mundo, então os bancos de dados não têm muitas informações sobre os peptídeos destes animais. Não se compara ao que existe em mamíferos”, afirma Solange. A falta de dados dificultou identificar de forma automática as cadeias de aminoácidos, e muitas vezes foi preciso fazer o sequenciamento manualmente, ressalta a pesquisadora.

A pesquisadora ressalta que, ainda que venenos de cobras contenham moléculas com atividades biológicas interessantes, o trabalho não visa descobrir um novo medicamento, e que a descoberta das moléculas com características anti-hipertensivas representam apenas um potencial. Para chegar a um remédio, é preciso tempo e investimento em novos estudos, pondera. 

(Fonte: G1)