Descobertas de planetas semelhantes à Terra reforçam busca por vida alienígena

Dentro e fora do Sistema Solar, especialistas consideram extremamente provável que haja vida microscópica.
 
Em 19 de abril de 1963, o jornal The New York Times noticiou para o mundo: "Outro sistema solar é encontrado a 36 milhões de anos-luz da Terra". O astrônomo holandês Peter van de Camp detectara o movimento de um pequeno corpo luminoso em torno da Estrela de Barnard. A notícia deixou o meio científico eufórico - por pouco tempo. Por volta de 1974, o consenso era que movimentos na lente do telescópio utilizado na descoberta haviam sido responsáveis pela aparente oscilação na luz da estrela, tomada pelo cientista como produzida pela passagem de um planeta em seu entorno.

Meio século depois, a descoberta de sistemas solares no Universo é uma realidade em ascensão - o que apenas reforça a coceira atrás da orelha: com tantos planetas, haverá vida lá fora? Para especialistas, a resposta é "provavelmente sim".

- Inevitavelmente deverá haver uma estrela semelhante ao nosso sol, com seus planetinhas, e um deles estar a uma distância adequada (para desenvolvimento de vida como a nossa) - analisa o coordenador do Laboratório de Astronomia da Faculdade de Física da PUCRS, Délcio Basso.

A busca por essa estrela está cada vez mais quente. Nos últimos anos, missões espaciais detectaram milhares de sóis e planetas na Via Láctea, alguns bastante semelhantes à Terra. Em janeiro, pesquisadores do Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics estimaram que nossa galáxia abrigue, no mínimo, 17 bilhões de planetas do tamanho do nosso.

Isso tudo é só o começo

As primeiras confirmações de exoplanetas datam da década de 1990. Grandes avanços foram feitos em 2006 e 2009, respectivamente, quando as sondas CoRoT e Kepler foram lançadas ao espaço com o objetivo de detectar mundos como o nosso. As caça-terras buscam estrelas estáveis, capazes de fornecer energia por bilhões de anos (tempo suficiente para desenvolvimento de vida) a corpos planetários localizados na zona habitável de seu sistema. Essa procura está intimamente ligada à busca por vida extraterrestre.

- Kepler revolucionou nosso entendimento sobre os exoplanetas e sua abundância. Haverá muitos estudos novos com grandes telescópios e novas técnicas desenvolvidas para aprender mais sobre esses astros, como, por exemplo, a composição de sua atmosfera - aponta o professor de ciências planetárias da Universidade do Arizona Alfred McEwen, que atua em missões para Saturno e Lua.

Ambas as missões estão, na prática, encerradas. Não encontraram outra Terra, mas chegaram perto. Em abril último, a Nasa apresentou ao mundo Kepler-62e e Kepler-62f. Dos milhares de planetas já avistados pela sonda Kepler, Kepler-62e seria o mais similar ao nosso. À distância que está da estrela que orbita, receberia quantidade tolerável de energia e teria temperaturas amenas. Tudo isso somado ao tipo adequado de atmosfera seria sinônimo de água líquida - condição básica de um ambiente propício para vida.

A busca continua. A Agência Espacial Europeia e a Nasa têm planos de lançar novos telescópios espaciais em 2017. Cheops e Tess buscarão ampliar o conhecimento sobre exoplanetas já conhecidos, com o auxílio de telescópios terrestres de última geração. Cedo ou tarde, devemos ser apresentados ao nosso planeta-irmão - por mais que não consigamos superar os anos-luz que nos separem.

Vida em todo o lugar

A princípio, não há nada de extremamente especial na Terra que não pudesse, hipoteticamente, se repetir no universo. Para Délcio Basso, a questão é menos "há vida?" e mais "que tipo de vida?".

- A vida em nível microscópico deve estar difundida nas nebulosas afora. Agora, outra coisa é vida autoconsciente - esclarece Basso.

O mesmo vale para o Sistema Solar. Fotografados nas décadas de 1970 e 1980 pelas sondas americanas Pioneer e Voyager, satélites como Europa (Júpiter), Titã e Encélado (ambos de Saturno) são até hoje, alguns dos locais mais cotados para abrigar vida nas "cercanias da Terra", em grande parte por conterem alguma forma de água.

- A pequena lua Encélado tem erupções de nuvens de vapor de água, proveniente de fissuras recentes, portanto, pode haver água em estado líquido em seu interior. A grande lua Titã também, provavelmente tem água em estado líquido em seu interior profundo - explica McEwen.

Apesar de estarem distantes demais do Sol, as forças de maré - efeito secundário da gravidade - desempenhadas pelos planetas-pais é capaz de gerar energia e aquecer os mares congelados que muitos desses satélites abrigam.

- Uma das atrações turísticas no futuro serão pescarias em Europa (lua de Júpiter) - arrisca Délcio Basso.

Marte também é habitat provável de algum tipo de vida, segundo Basso, ainda que em nível microscópico.

- Deve haver líquens, coisas rastejantes - afirma.

Mesmo o planeta mais próximo da Terra, porém, ainda não foi pisado pelo homem

Aprendizado no quintal

O conhecimento adquirido por aqui nos permite, também, enriquecer o conhecimento dos mundos distantes que hoje conseguimos detectar, a dezenas, centenas ou milhares de anos-luz daqui.

- O que tem que ficar claro é o seguinte: a Lua é nosso pátio dos fundos. Os planetas estão mais longe. Só que existe um verdadeiro abismo até as estrelas - descreve Basso.

O abismo reflete em limitações. O método de trânsito utilizado pela missão Kepler (observando variações luminosas de estrelas, possivelmente causadas pela passagem de corpos massivos em seu entorno) não é capaz de precisar a massa e a densidade dos exoplanetas. Por que a massa é importante? Porque é elemento central para a ocorrência de um fenômeno de que se fala muito, mas se sabe pouco: a gravidade, essencial para a retenção de atmosfera que, por sua vez, regula a temperatura e protege os planetas e seus eventuais habitantes da perigosa radiação ultravioleta solar.

As suposições restam distantes, onde a ciência alcança, mas nenhum objeto criado pelo homem nunca pôde vagar. Esse cenário deve mudar sensivelmente em breve, com uma nova marca: neste mês, a Nasa divulgou que, 35 anos após seu lançamento, a sonda pioneira Voyager 1 está a 18,4 bilhões (123 UA, 34 horas-luz) de quilômetros da Terra, prestes a cruzar a fronteira entre o Sistema Solar e o meio interestelar.

É questão de menos de uma década, acreditam especialistas. Ainda que só deva alcançar a estrela mais próxima de nós em algo como 73 mil anos, a Voyager deve detectar in loco aquilo que, daqui, sequer sonhamos enxergar. Um passo gigantesco para o homem e para a humanidade.

(Fernando Corrêa / Zero Hora)

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