Aquecimento global produz uma nova geração de animais híbridos

Ursos, baleias, focas e golfinhos mestiços aumentam risco de extinção. A rápida perda de gelo do Ártico (a despeito da atual onda de frio severo na Europa, o Ártico está mais quente) está levando ao surgimento de híbridos de espécies relacionadas, o que ameaça acelerar a extinção de alguns dos animais mais vulneráveis da região.

De acordo com os cientistas, a menor área do Oceano Ártico coberta por gelo flutuante está forçando os ursos polares a manterem contato com os ursos cinzentos do norte do Canadá e do Alasca, gerando híbridos que ameaçam a integridade genética única de ambas espécies.

Outros híbridos já encontrados na região incluem um cruzamento de baleias beluga e narval e uma aparente união entre baleias da Groenlândia e franca. Espécies de botos e focas também já teriam começado a se misturar, afirmam os pesquisadores.

Urso polar híbrido era malhado

O primeiro híbrido entre ursos polares e cinzentos encontrado na natureza foi morto por caçadores em 2006. Ele era branco com manchas marrons e testes de DNA confirmaram se tratar de um cruzamento entre as duas espécies. Embora casos de miscigenação já terem sido detectados entre ursos em cativeiro, nenhum tinha sido achado na natureza ainda.

No início de 2010, mais um híbrido foi morto por caçadores no Alasca. Desta vez, porém, os testes de DNA confirmaram que ele era um híbrido de segunda geração, isto é, filho de uma fêmea mestiça com um urso cinzento.

Segundo os cientistas, o número real de casos deve ser muito maior. Devido a mudanças trazidas pelo Aquecimento Global, esses animais estão passando mais tempo no litoral à espera da formação de gelo no mar, o que os faz manter um contato mais próximo com seus primos cinzentos.

Brendan Kelly, do Laboratório Nacional de Mamíferos Marinhos dos EUA em Juneau, Alasca, liderou um estudo que identificou 34 possíveis hibridizações entre populações ou espécies de grandes mamíferos do Ártico e seu entorno.

_ As previsões são de que o Oceano Ártico não deverá ter mais gelo durante os verões até o fim do século, o que vai remover uma barreira do tamanho de um continente contra esses cruzamentos. Os ursos polares estão passando mais tempo nas mesmas áreas habitadas pelos cinzentos. Baleias e focas hoje isoladas pelo gelo em breve dividirão as mesmas águas - afirma Kelly em artigo publicado na revista "Nature". - Nem todos os cruzamentos de espécies produzem filhotes viáveis, mas as possibilidades são maiores entre os mamíferos do Ártico porque o seu número de cromossomos variou pouco.

Embora o surgimento de híbridos seja uma característica comum da evolução, os cientistas acreditam que a hibridização no Ártico devido às mudanças climáticas terá grandes impactos, especialmente para animais altamente especializados como os ursos polares, que dependem de um comportamento altamente evoluído.

Mestiço não tem o mesmo talento de caçador

Zoólogos na Alemanha, por exemplo, estudaram híbridos entre ursos polares e cinzentos nascidos em cativeiro e descobriram que embora eles usem as estratégias típicas dos ursos polares para caçar focas, não têm as mesmas habilidades para nadar e realizar suas caçadas.

Andrew Whiteley, da Universidade de Massachusetts, diz que o cruzamento pode ser especialmente problemático para espécies raras ou ameaçadas. Há apenas 200 baleias francas do Atlântico Norte na natureza e sua própria existência está em risco com a hibridização com as baleias-da-Groenlândia, mais comuns.

- A hibridização pode levar à perda da biodiversidade. Linhagens distintas que levaram milhares de anos para evoluir vão acabar se misturando - explica.

Os cientistas estimam que existem cerca de 22 mil ursos polares do Ártico e que sua população deve cair em um terço até a metade do século, se o gelo continuar a retroceder ao ritmo atual, levando ao seu desaparecimento total durante os verões em 2060.

(Steve Connor - O Globo)

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