Contra-ataque aos vírus


Estudo genético promete levar a novas armas contra Aids e gripe.
Pela primeira vez, cientistas decifraram a estrutura completa do genoma do vírus HIV. O estudo de pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, permitirá entender melhor as estratégias que o microorganismo usa ao infectar os seres humanos e ainda ajudar no desenvolvimento de novos medicamentos contra infecções virais, inclusive as gripes letais e os resfriados comuns.

Segundo os autores, o estudo abre muitas oportunidades para a pesquisa de novas drogas contra vírus.

- Há uma lista enorme de coisas que podemos tentar - afirmou o cientista Kevin Weeks, da Universidade da Carolina do Norte e principal autor do trabalho, publicado esta semana na "Nature".

A técnica se mostrou eficiente para decifrar o genoma de vírus de RNA, como o HIV. Tal como o vírus da gripe, da poliomielite e outros que causam resfriados, o da Aids usa RNA em vez do DNA (molécula de ácido desoxirribonucleico) para se multiplicar.

Enquanto o DNA depende da construção de blocos chamados nucleotídeos para transportar as informações em suas duas fitas, o RNA tem apenas uma fita. Então ele depende de padrões complexos para carregar os dados genéticos.

Remédios mais eficazes

Há grande estrutura no genoma do RNA do HIV que antes tinha um papel quase desconhecido na expressão do código genético, disse Weeks. A sua equipe desenvolveu uma técnica chamada SHAPE para fazer imagem não só dos nucleotídeos do RNA, mas das formas e dobras da sua fita. Outros métodos de imagem, tais como a cristalografia por raios X, podem capturar a posição exata de cada átomo, mas apenas uma pequena área de cada vez.

A tecnologia SHAPE permite um panorama maior, mas não a nível atômico.

- É o mesmo que fazer um zoom num mapa para obter uma perspectiva mais ampla do cenário, à custa de detalhes finos - comentou o cientista Hashim Al Hashimi da Universidade de Michigan, em artigo publicado na "Nature".

Com essa análise será mais fácil criar novos fármacos, acreditam os autores.

Os medicamentos novos são freqüentemente projetados para se encaixar em estruturas específicas num vírus, impedindo que ele possa grudar numa célula ou complicando a sua replicação.

Porém, é difícil se defender de vírus de RNA. Há mais de 20 drogas contra o HIV e elas exigem várias combinações para mantê-lo sob controle. Muitas cepas de gripe, por exemplo, resistem aos antivirais antigos e algumas ainda sofrem mutações, dificultando o ataque com drogas modernas, como o Tamiflu.

Segundo Weeks, a nova técnica de exame de imagem vai ajudar a pesquisadores a buscar novas abordagens de tratamento. Cientistas apostam em medicamentos chamados siRNAE. Eles atacam o funcionamento do RNA e podem interferir nas células com defeito ou bactérias e vírus. Alguns laboratórios já trabalham com esse enfoque.

Variante aumenta mistério

Cientistas europeus descobriram uma nova linhagem de HIV e a associaram a gorilas. Não se sabe quando e como foi contraída pela primeira vez por um ser humano.

Trata-se da primeira vez que cientistas identificam um caso de transmissão de um vírus de imunodeficiência de um gorila para seres humanos. Todas as linhagens conhecidas do vírus HIV são associadas a vírus de chimpanzés que sofreram mutações e originaram microorganismos capazes de infectar seres humanos.

A explicação mais provável para o surgimento do novo vírus é que ele seja resultado do abate de gorilas para consumo da carne.

Outra possibilidade é que o vírus tenha surgido em chimpanzés, sido transmitido para gorilas e só depois passado para seres humanos.

O novo vírus foi isolado em 2004, mas sua identificação só foi concluída recentemente, apresentada num artigo na revista "Nature Medicine". O vírus foi encontrado em amostras do sangue de uma mulher de 62 anos, logo após esta chegar a Paris, proveniente da República de Camarões, na África.

A mulher não manifestou qualquer sintoma específico da Aids. Porém, relatou ter começado a perder peso em 2003 e ter sofrido vários episódios de febre.

Os autores do estudo acreditam que a mulher contraiu o vírus em relações sexuais. Ele contou que teve vários parceiros em seu país, mas não sabe se algum deles tem Aids. Para os cientistas, outras pessoas foram contaminadas em Camarões e o caso da mulher não seria o primeiro.

(O Globo, 6/8)

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