Brasileiros desenvolvem melanina para bioeletrônica

Pesquisadores brasileiros estão viabilizando o uso de uma substância biológica - a melanina - para a fabricação de componentes bioeletrônicos, interfaces que permitem conectar circuitos eletrônicos aos seres vivos.

Brasileiros desenvolvem melanina para dispositivos bioletrônicos
Os transistores bioeletrônicos representam o passo final para a viabilização da conexão entre biologia e eletrônica. [Imagem: Jose Garrido]
Bioeletrônica
"Todos os materiais que têm sido testados atualmente para aplicações em bioeletrônica são completamente sintéticos. Uma das grandes vantagens da melanina é que, sendo um composto totalmente natural e biocompatível com o corpo humano, tem potencial para ser usado em dispositivos para fazer a interface entre neurônios cerebrais e a eletrônica, por exemplo", explicou o professor Carlos Frederico Graeff, da Unesp de Bauru (SP).
O grande objetivo da bioeletrônica é a combinação de componentes eletrônicos e biológicos, de modo a desenvolver dispositivos implantáveis miniaturizados, capazes de alterar e controlar sinais elétricos no corpo humano.
Esse campo emergente saiu recentemente dos laboratórios e chegou às manchetes, quando o Google e a farmacêutica GlaxoSmithKline anunciaram uma associação para explorar essa área, considerada uma nova fronteira tanto pelo lado da eletrônica quanto da biologia.
Melanina biossintética
Um dos desafios para viabilizar o desenvolvimento dos dispositivos bioeletrônicos é identificar materiais que, além de apresentarem condutividade eletrônica (à base de elétrons), também possuam condutividade iônica (à base de íons), o modo de comunicação usado pelos neurônios. E que, além disso, sejam biocompatíveis com o corpo humano.
Graeff e seus colegas conseguiram desenvolver uma nova rota para sintetizar mais rapidamente a melanina, o composto polimérico que dá pigmentação à pele, olhos e cabelos dos mamíferos, e que possui tanto condutividade eletrônica quanto iônica.
Um dos desafios para utilizar a melanina na bioeletrônica é que o composto - assim como outros materiais à base de carbono, como o grafeno - tem baixa dispersão em meio aquoso, o que dificultava sua utilização na produção de filmes finos. Além disso, o processo convencional de síntese da melanina é complexo, com etapas difíceis de serem controladas, pode durar até 56 dias e ainda resultar em estruturas desordenadas.
A melanina biossintética obtida pelo novo processo apresenta boa dispersão em água e é muito semelhante à natural. O processo leva apenas algumas horas e é baseado em ajustes de parâmetros, como a temperatura, e na aplicação de uma pressão de oxigênio para promover a oxidação do material.
A pressão de oxigênio eleva a densidade no material do grupo carboxílico - composto por dois átomos de oxigênio ligados a um carbono, sendo um através de uma ligação dupla e outro através de uma ligação simples. Entre outras funções, esse grupo aumenta a solubilidade e a facilidade de se obter suspensões de melanina biossintética na água.
"Isso facilita bastante a obtenção de filmes finos de melanina com alta homogeneidade e qualidade", explicou Graeff.
Transistores bioeletrônicos
Por meio do aumento da densidade do grupo carboxílico, os pesquisadores também conseguiram tornar a melanina biossintética mais semelhante à biológica.
No processo de síntese natural da substância, que ocorre nos organismos vivos, há uma enzima que facilita a produção de ácidos carboxílicos. A nova rota de síntese da melanina consegue mimetizar quimicamente o papel dessa enzima e aumentar a densidade dos grupos carboxílicos.
"Temos conseguido obter por síntese química um material mais próximo do biológico e fazer filmes de qualidade muito boa para utilizá-los em dispositivos bioeletrônicos," afirmou Graeff.
Por meio de colaborações com instituições de pesquisa do Canadá, os pesquisadores brasileiros já começaram a usar a melanina biossintética para o desenvolvimento de contatos elétricos, sensores de pH e em células fotovoltaicas.
Mais recentemente, eles começaram a tentar desenvolver transistores.

"Nosso objetivo maior é obter transistores justamente para promover a junção da eletrônica com sistemas biológicos", disse Graeff.
(Fonte: Inovação tecnológica - Com informações da Agência Fapesp -)