Orfanato na Costa Rica abriga bichos-preguiça abandonados

As florestas tropicais da Costa Rica têm o maior índice de bichos-preguiça abandonados por suas mães do mundo. Um orfanato cuida desses filhotes. Cerca de 130 animais já foram recuperados e devolvidos à natureza.

Claire Trimer é a supervisora do berçário do santuário de bichos-preguiça Aviarios. Ela pesa e alimenta cerca meia dúzia de filhotes todas as manhãs. Alguns bichos-preguiças, como Linus, de um ano de idade, precisam de cuidados especiais na hora da alimentação. O filhote tem uma deformação na boca e essa pode ser a razão pela qual ele foi abandonado por sua mãe. Ele é o favorito entre os funcionários.
Linus chegou bem jovem ao santuário. “Sua boca era e ainda é deformada. Não sabemos se foi um defeito de nascença ou se ele se machucou chupando suas garras no útero da mãe, mas ele não consegue fechar a boca completamente, o que significa que ele não consegue sugar”, relembraTrimer.
O berçário fica numa área ao ar livre onde cada animal pode ter sua própria e espaçosa jaula, equipada com cobertores e brinquedos. Com 150 animais residindo no orfanato, o projeto é o único desse tipo no mundo. Exuberante e tranquilo, o santuário ocupa uma área preservada de 120 hectares. Quase todos os dias, os visitantes podem percorrer o projeto e tirar fotos dos adoráveis bichos-preguiça.
Mas além de abrigar inúmeros tesouros naturais, as florestas tropicais da Costa Rica estão produzindo um misterioso fenômeno: mais do que em qualquer floresta tropical do mundo, um grande número de filhotes de bicho-preguiça é abandonado pelas mães. Uma teoria sugere que o abandono pode estar relacionado com uma mutação genética causada por pesticidas.
Muitos dos filhotes são encontrados no chão das florestas da Costa Rica e são recolhidos por funcionários do Ministério do Meio Ambiente, que tropeçam nos pequenos bichos-preguiça, muitas vezes com poucos dias de idade. Muitos bichos-preguiça adultos também são levados ao orfanato com ferimentos graves causados pelo desmatamento, tráfico, cabos de energia elétrica ou pela brutalidade dos seres humanos.
“Muitas pessoas acreditam que o animal é demoníaco, já que carrega a preguiça, um dos pecados capitais, em seu nome”, diz Becky Cliffe, doutoranda britânica que trabalha num projeto que pesquisa os bichos-preguiça na natureza, desde como eles se alimentam e dormem até seus padrões de comportamento e densidade populacional.
“Na Costa Rica esse é um grande problema por se tratar de um país religioso. Recebemos animais que foram queimados, atropelados e espancados com varas”, completa a britânica.
Os mistérios dos bichos-preguiça – “Estou trabalhando com um diário”, explica Cliffe, “no qual registro dados sobre tudo que o animal faz. É quase como se o próprio bicho-preguiça escrevesse o diário. Eu também insiro dados do que chamo de ‘mochila do bicho-preguiça’, um rastreador que permite saber onde animal está e o que ele está fazendo”.
Cliffe é uma das poucas pesquisadoras que está tentando descobrir mais sobre esse misterioso animal.
“As pessoas pensavam que eram tão devagar e por isso não eram muito interessantes. Eles passam o dia todo sentados nas árvores, sem fazer muita coisa, por isso ficaram meio de lado por muito tempo”, diz Cliffe. “Agora, estamos começando a perceber que eles muito diferentes dos outros mamíferos.”
Os bichos-preguiça não armazenam leite como os outros mamíferos e também não demonstram nenhum sinal externo de gravidez, nem ao menos uma barriguinha. Eles também são os animais mais lentos do planeta, demorando 30 dias para digerir uma única folha. Eles descem da árvore apenas uma vez por semana para defecar. Esse é um enigma evolutivo, já que o animal acaba sendo muito vulnerável aos predadores.
O orfanato abriga ambas as espécies existentes na reserva indígena, os Choloepus (de dois dedos) e os Bradypus (de três dedos), que são famosos pelo seu sorriso permanente. Os de três dedos tendem a ser mais visíveis, já que se locomovem durante o dia, enquanto os de dois dedos são noturnos e se escondem durante o dia. “Eles são animais muito diferentes e não deveriam ser chamados pelo mesmo nome”, diz Trimer.
Sem habilidades de sobrevivência – “Na natureza, uma preguiça de dois dedos vai manter seu bebê até ele completar um anos”, explica Timer. “Durante esse tempo, a mãe ensina o bebê muitas das suas habilidades de sobrevivência. Eles não sabem instintivamente distinguir se a vegetação é comestível ou tóxica. Elas também ensinam seus filhos a se mover lentamente, já que os movimentos rápidos chamam a atenção dos predadores”, completa.
Problemas surgem, no entanto, quando o filhote chega ao orfanato sem ter passado um tempo significativo com sua mãe. Uma vez que ele não tem as habilidades necessárias de sobrevivência, pode ter que viver em cativeiro pelo resto da vida. O santuário solta todos os adultos de volta a natureza, a não ser que eles tenham sequelas permanentes que afetem sua sobrevivência.
Ubu vive na parte externa do santuário com fileiras de jaulas dedicadas aos animais adultos. Com apenas alguns anos de vida, ele chegou ao santuário paralisado da cintura para baixo e vai permanecer em cativeiro pelo resto de sua vida.
“Na esperança de que ele consiga regenerar alguns de seus movimentos, começamos a fazer fisioterapia improvisada”, diz Trimer. “O interessante é que, apenas usando os braços, ele consegue balançar dentro da gaiola com a mesma rapidez que uma preguiça totalmente normal.”
O orfanato de bichos-preguiça Aviarios é um projeto familiar e é financiado com recursos vindos de excursões diurnas e das pessoas que passam a noite no hotel que fica dentro da reserva, além de doações.
No começo da década de 1990, a americana nativa do Alaska Judy Arroyo e seu marido costa-riquense Luis abriram o hotel na propriedade, mas um grande terremoto destruiu seu negócio, uma reserva turística de observação de pássaros.
Depois que três garotas da região trouxeram um filhote de bicho-preguiça abandonado para a propriedade do casal, a vida deles nunca mais foi a mesma. Passados 21 anos, a preguiça Buttercup ainda é a querida mascote do orfanato.
Através de uma observação cuidadosa e de muito bom senso, os Arroyo inovaram nas pesquisas sobre os bichos-preguiça e foram capazes de determinar fatores como sua dieta, habitat e comportamento do sensível e solitário animal. Examinar os dentes negros de Buttercup, por exemplo, ajudou Judy a deduzir que ela comia folhas de embaúba, já que o tanino de suas folhas deixa um resíduo escuro.
Arroyo recebeu críticas de alguns ativistas dos direitos dos animais, que dizem que é melhor manter os bichos-preguiça na natureza do que enjaulados para recuperação. “Um filhote que cresceu em cativeiro não pertence à natureza”, rebate Arroyo. “Ele não tem suas habilidades naturais de defesa e é provavelmente de um grupo genético diferentes dos que se encontram na natureza”, completa.
Quanto às preguiças machucadas e reabilitadas, o orfanato faz um trabalho para reintroduzi-las de volta à natureza. Até agora 130 já foram devolvidas ao seu habitat natural. Outro objetivo do orfanato é encontrar lares adequados em zoológicos para as preguiças que devem permanecer em cativeiro. Mas com as barreiras burocráticas impostas pelo governo da Costa Rica, a tarefa é um crescente desafio, deixando o orfanato com mais bichos-preguiça do que os funcionários podem dar conta. 
(Fonte: Terra)

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