Maior dino carnívoro do Brasil media até 14 metros
Análise da Folha: cuidado com a divulgação é "rito de passagem" para a paleontologia no País.
É como se o Brasil tivesse ganhado, enfim, um tiranossauro para chamar de seu. Medindo entre 12 m e 14 m e pesando algumas toneladas, o bicho batizado de Oxalaia quilombensis provavelmente está entre os cinco maiores dinossauros carnívoros já descobertos.
"Ele perde apenas para os maiores tiranossauros e para algumas outras espécies", disse à Folha o paleontólogo Alexander Kellner, do Museu Nacional da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Ele é o coordenador da equipe responsável pela "certidão de nascimento" científica do animal. A descoberta, integrou o que talvez tenha sido o maior anúncio conjunto da história da paleontologia brasileira.
Trupe
No mesmo evento, outros pesquisadores revelaram uma "nova" espécie de crocodilo da Era dos Dinossauros, um lagarto extinto e os primeiros indícios de que dinos brasileiros também eram cobertos de penas, como seus primos chineses.
Os achados foram detalhados em artigos no periódico científico "Anais da Academia Brasileira de Ciências", publicação na qual Kellner exerce o papel de editor-chefe.
Os restos do O. quilombensis, com pouco menos de 100 milhões de anos, vieram da ilha do Cajual, no Maranhão. Isso explica o sabor africano do nome do bicho, já que a ilha abriga um quilombo. Ademais, a criatura tem mais características em comum com seus primos da África do Norte do que com as formas brasileiras de seu grupo.
O grupo em questão é o dos espinossauros, bichos que são mais ou menos o que acontece quando se cola um focinho de jacaré num corpo de dinossauro. A cara alongada e a dentição, entre outras pistas, sugerem que os animais passavam boa parte do tempo na água, alimentando-se de peixes.
"Eles ainda são misteriosos, faltam esqueletos completos", diz Kellner. O próprio O. quilombensis é exemplo disso, já que sua descrição baseia-se apenas num fragmento do focinho e num pedaço do maxilar.
Mistério semelhante ronda as penas encontradas por pesquisadores da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e da Universidade Regional do Cariri na chapada do Araripe (CE).
"O que dá para dizer é que, seja lá qual fossem os animais com penas no Araripe, eles não voavam", afirma Juliana Sayão, da UFPE. É que nenhuma delas conta com ganchos e bárbulas (reforços que unem os filamentos da pena entre si), essenciais para o voo das aves atuais.
Até aí, algum tipo de ave que não voa, como as emas atuais, poderia ser a "dona" dessas penas. Mas, em um caso, a pena encontrada lembra muito formas que até hoje só apareceram associadas a dinos. "Para ter certeza, só achando as penas associadas ao animal", diz Sayão.
Os outros astros do evento foram o lagartinho Brasiliguana prudentis, primo extinto das iguanas, e o crocodilo terrestre Pepesuchus deiseae, que media até 3 m. Os dois viviam na região de Presidente Prudente (SP).
Cuidado com a divulgação é "rito de passagem" para a paleontologia no País
(Análise do editor de Ciência da Folha de São Paulo, Reinaldo José Lopes)
Depois de presenciar a coreografia de relações públicas que acompanhou a publicação da descoberta de novas espécies fósseis brasileiras, não dá para negar que a paleontologia chegou à maturidade no país.
Anúncios de impacto, com entrevista coletiva e bonito material visual preparado com antecedência para a imprensa, já são tradição entre as principais equipes de caçadores de fósseis do mundo e aconteciam por aqui em menor escala, mas o evento de ontem alcançou outro nível de magnitude.
É natural que seja assim, em certo sentido, porque a relação da paleontologia com o público envolve a conquista constante de corações e mentes. O fascínio por criaturas grandes, poderosas e extintas ajuda a manter de pé a mitologia que circunda essa área de pesquisa.
O paleontólogo Alexander Kellner é ao mesmo tempo editor-chefe dos "Anais da Academia Brasileira de Ciências", revista onde estão saindo as descobertas, e autor de vários dos trabalhos publicados nessa edição.
Todo artigo científico passa pela chamada revisão por pares, na qual especialistas independentes avaliam, de forma anônima, a pesquisa antes da publicação. Kellner admite, brincando, que há uma certa "saia justa" em ser editor de uma revista para a qual submete artigos, mas pondera: "Se eu enviar trabalhos de baixa qualidade para a revista, o primeiro prejudicado serei eu mesmo".
"Eu tenho uma agenda, que é transformar os "Anais" numa revista que não fique devendo nada à "Nature" ou à "Science" [as principais publicações do ramo no mundo]. Com trabalhos importantes como esses que estamos publicando, certamente a revista será mais citada e seu impacto vai crescer", diz ele.
Eis mais um sinal de que a paleontologia brasileira começa a pensar em como se posicionar, do ponto de vista estratégico, dentro da ciência mundial.
(Folha de São Paulo)
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