23,9 mil crianças vivem nas ruas em todo país

Cerca de 70% das crianças e adolescentes, que abandonaram a casa dos pais, vivem e dormem nas ruas há mais de 6 meses em todo o país.

Destas, somente 23,3% preferem buscar abrigo em instituições de amparo para dormir, 64% passam as noites em companhia de amigos, 14,6% perambulam sozinhas e 13,8% não se alimentam diariamente. Estes são alguns dados da primeira Pesquisa Censitária Nacional sobre Crianças e Adolescentes em Situação de Rua, encomendada pela Secretaria de Direitos Humanos (SeDH).

O relatório traça um perfil deste público infanto-juvenil e mostra que a violência dentro de casa, as drogas e o alcoolismo são as principais causas do abandono do lar. As brigas entre pais e/ou irmãos, a violência doméstica e o abuso sexual são responsáveis por 71,6% das razões que levam essas pessoas a deixarem a família. O alcoolismo e as drogas representam 30,6% dos fatores. (Ver quadro completo)

O levantamento foi realizado entre 10 de maio e 30 de junho de 2010 pelo Instituto de Pesquisa Meta para auxiliar na elaboração de estratégias para desenvolvimento de políticas públicas dirigidas às crianças e adolescentes. O estudo foi realizado em 75 cidades brasileiras, abrangendo todas as capitais e alguns municípios com mais de 300 mil habitantes.

Os pesquisadores identificaram 23.973 crianças e adolescentes em situação de rua no país, 1.470 recusaram-se a participar da análise. Em Cuiabá, foram encontradas 81 jovens nas ruas. Os estados do Rio de Janeiro e São Paulo foram os que mais registraram casos, com 5.091 e 4.751, respectivamente.

Do total pesquisado no Brasil, 52,2% voltam à casa da família para dormir, outros 6,9% repousam em residências de parentes e amigos e 1,3% oscilam entre os 2 destinos para passar a noite. Os dados apontam que 23,2% abandonaram completamente os lares e vivem de forma contínua pelas ruas.

Para a representante Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Glícia Salmeron, a pesquisa mostra vínculo entre a maioria dos entrevistados com suas famílias. Um ponto positivo que deve ser fortalecido para que este público deixe de perambular e fique protegido. Entre os entrevistados, 71,3% garantem manter contato com a família.

Perfil - Conforme o estudo, a maioria dos entrevistados é homem (71,8%) com idade entre 12 e 15 anos (45,13%). A pesquisa identificou também 6.461 jovens na faixa-etária dos 16 e 17 anos, 5.178 têm de 6 a 11 anos. Também foi constatada a existência de crianças com até 3 anos (352) e de 4 a 5 anos (340).

O levantamento mostra que 49,2% das crianças e adolescentes em situação de rua se declararam pardos ou morenos, 23,8% brancos e 23,6% negros. Além disso, os níveis de renda são baixos, sendo que 40,3% das crianças e adolescentes em situação de rua vivem com renda média de até R$ 80 semanais. Apenas 18,8% afirmaram ter renda semanal superior a esse valor.

O nível de escolaridade também deixa a desejar. Embora 40,2% afirmem que estudam atualmente, 8,3% não sabem ler e 12% disseram apenas saber escrever o nome. Somente 0,6% chegaram a concluir o Ensino Médio, 39% frequentaram as escolas até a 4ª série do Ensino Fundamental e 31,3% concluíram até a 7ª série.

Nas ruas – Entre as crianças e adolescentes que nunca voltam para casa dos pais ou família e dormem nas ruas, somente 23,3% buscam abrigo em casa de amparo. Outros 62,1% preferem dormir nas ruas. A falta de liberdade dentro das instituições (59,4%), a proibição do uso de drogas e álcool (38,6%) e a obrigatoriedade em respeitar os horários (26,9%) são apontados como os motivos principais para não frequentar os abrigos.

Entre os que costumam dormir nas ruas, 77,1% relataram sofrer algum tipo de preconceito e discriminação, principalmente ao tentarem entrar em shoppings e comércios (36,6%), no transporte coletivo (31,1%) e em bancos (27,4%).

Abandono público - A conselheira do Conanda destaca que os dados da pesquisa mostram que mesmo depois de duas décadas de implantação do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) há muito o que se fazer em favor das crianças e adolescentes que têm seus direitos violados ou ignorados. Glícia afirma que os municípios brasileiros não colocam à frente os direitos das crianças que deveriam ser prioridade absoluta do poder público. “Percebemos que não existe um cuidado com a implantação de políticas públicas para proteger o público infanto-juvenil”.

A advogada aponta que investir em educação de qualidade, cursos profissionalizantes e fortalecimento da família são pontos indispensáveis para que esses jovens saiam da situação de risco que vivem. Ela entende que existe uma má administração pública em todo Brasil, com investimento inadequado de verbas e técnicos sem preparo adequado para atender às famílias. “É preciso que exista um serviço de rede integrado, com participação da sociedade e do poder público”.

Para Glícia, todos os cidadãos precisam ainda ter uma maior compreensão sobre a situação da criança que está na rua, entender que elas têm direito e dar esmola não é a melhor saída. “Elas não precisam da dó de ninguém, precisam ter seus direitos respeitados. Muitos não entendem que ser fiscal da situação é muito mais importante que dar um trocadinho. Quando vemos uma criança nas ruas temos que acionar o Conselho Tutelar, fazer um registro da situação para que as providências sejam tomadas”.

Cuiabá - Na Capital mato-grossense, onde foram identificadas 81 crianças e adolescentes em situação de rua, a Secretaria Municipal de Bem-Estar Social afirmou, por meio da assessoria de imprensa, que dispõe de 2 Centros de Referência Especializado da Assistência Social (Creas) que funcionam 24 horas, 6 Conselhos Tutelares, 13 Centros de Referência de Assistência Social, uma Casa de Retaguarda, além de convênios com instituições para atender a demanda.

A secretaria destaca que todo trabalho feito com a população visa manter o jovem no seio familiar, acionando os pais e acompanhando a situação com equipe multidisciplinar. Em casos de extrema pobreza, essas famílias são inseridas em programas sociais remunerados, como o Bolsa Família, Programa de Erradicação ao Trabalho Infantil (Peti) e o Projovem.

Fonte: A Gazeta

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