Entre esponjas e detergente

Novos produtos podem remover petróleo derramado no mar.

© Mark Ralston/AFP
Derramamento de petróleo no golfo do México

O vazamento de petróleo no mar é um problema de países como o Brasil, que concentra grande parte da exploração de óleo em ambiente marinho e com tráfego de navios petroleiros entre os locais de exploração e os terminais marítimos. Por isso, não foi preciso nem a eclosão do maior acidente do gênero no golfo do México, iniciado em abril deste ano com a explosão e o afundamento de uma plataforma da British Petroleum (BP), que resultou no derramamento de mais de 4 milhões de barris de petróleo, contido completamente apenas em setembro, para que pesquisadores brasileiros aprofundassem os estudos sobre soluções para esse tipo de desastre ambiental. Pelo menos três grupos apresentaram recentemente resultados de pesquisas que poderão se transformar em breve em produtos para descontaminar o oceano. Eles trazem duas vantagens, a de serem biorremediadores – porque são menos tóxicos ao ambiente – e mais baratos que os produtos químicos utilizados atualmente. A primeira tecnologia é de um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) composto pelos professores Rochel Lago, Flávia Moura e Maria Helena Araújo. Eles desenvolveram um material capaz de absorver petróleo em acidentes na água ou em terra, denominado nanoesponja hidrofóbica, que repele a água e tem grande afinidade por compostos orgânicos, especialmente óleos.

O grupo foi sondado recentemente por uma empresa norte-americana interessada em utilizar o material no golfo do México. Mas ainda serão necessários alguns testes laboratoriais para que o produto possa ser testado no mar. A pesquisa iniciada em 2005 por Flávia e Lago levou ao desenvolvimento de um material macroscópico granular feito do mineral vermiculita com grânulos medindo entre três e cinco milímetros de diâmetro recobertos com uma camada nanoestruturada que confere ao material uma cor preta. Esse mineral já é utilizado há muitos anos, oferecido por várias empresas no mundo, inclusive no Brasil, para absorver óleo. O experimento do grupo da UFMG adiciona carbono e transforma esse mineral num material com melhor capacidade de absorção. “O carbono faz a vermiculita ter mais afinidade pelo óleo que pela água”, diz Maria Helena. O mineral isoladamente, de cor clara, quando aquecido adquire o aspecto de uma estrutura sanfonada e leve, parecida com uma esponja que flutua na água. O problema é que sem as nanoestruturas de carbono ele absorve mais água do que óleo. O que pesquisadores fizeram foi inverter essa característica com nanotecnologia.

Flávia explica que para produzir as nanoesponjas hidrofóbicas, a vermiculita, após ser esfoliada, é submetida a um processo de aquecimento controlado em um forno, com a introdução de uma fonte de carbono como etanol, gás natural ou mesmo glicerina, hoje um subproduto da fabricação do biodiesel. “Essas fontes decompõem-se na superfície da vermiculita, formando carbono de diferentes formas, como nanotubos, filamentos, grafite ou carbono amorfo”, explica. O processo altera as características da vermiculita. “Após a deposição do carbono, o mineral passa a absorver preferencialmente o óleo”, explica o doutorando Aluir Purceno, integrante do grupo. “A sua capacidade de absorção de até seis gramas de óleo por grama de material é superior à de outros produtos disponíveis no mercado.”

O produto tem mais vantagens. “O Brasil é um dos maiores produtores de vermiculita do mundo e, quando comparado a outros materiais, ela tem um custo muito baixo”, diz Purceno. O carbono usado para compor as nanoesponjas hidrofóbicas pode ser extraído de fontes abundantes e baratas como a glicerina.“Além de ser usado para remediar os derramamentos de óleo, consome parte da produção de glicerina, que poderá se tornar um problema ambiental nos próximos anos”, diz Miguel de Araújo Medeiros, professor da Universidade Federal do Tocantins (UFT) que fez seu doutoramento no grupo.

As nanoesponjas de vermiculita fazem parte de uma plataforma tecnológica do grupo da UFMG que ganhou em setembro deste ano o primeiro lugar na etapa da América Latina da competição internacional Idea to Product (“da ideia ao produto”), promovida pela Universidade do Texas, em Austin, nos Estados Unidos, e no Brasil organizada pelo Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo. Os ganhadores vão participar da etapa mundial em novembro nos Estados Unidos. Eles tiveram como parceira a empresa mineira Verti Ecotecnologias, que tem como sócio o professor Lago e fez o estudo da viabilidade técnica e econômica do projeto. “Apresentamos uma plataforma tecnológica que, além da nanoesponja, é composta por um produto chamado nanoamphil contendo nanopartículas de vermiculita, núcleos de ferro e nanoestruturas de carbono. Ele atua como um desemulsificante, substância que separa o petróleo da água do mar nas plataformas de exploração. As nanopartículas misturadas no petróleo aderem às gotas de água. Quando aproximamos um ímã as nanopartículas magnéticas do nanoamphil são atraídas pelo campo do ímã provocando a união das gotas. Após poucos minutos ocorre a completa separação da água do petróleo”, diz Purceno.

A terceira tecnologia que compõe a plataforma é um produto que retira o enxofre do petróleo nas refinarias. O trabalho rendeu quatro artigos científicos e duas patentes. Os pesquisadores foram financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Por meio do Programa de Apoio à Pesquisa em Empresas (Pappe) do Ministério da Ciência e Tecnologia, a empresa Vermiculita Isolantes Termoacústicos participou da elaboração das nanoesponjas de vermiculita. A empresa é uma produtora dessa argila e se interessou na parceria fornecendo o mineral e participando do processo de escalonamento da tecnologia, da passagem da produção em laboratório para a de maior escala.


(Fasesp - Evanildo da Silveira e Marcos de Oliveira)

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