Camundongos voltaram a se movimentar após tratamento com células adultas reprogramadas por japoneses. Grupo usou método de triagem que diminui o risco de tumor durante terapia, o que facilitaria uso em seres humanos
Roedores paralisados por lesões na medula espinhal voltaram a se movimentar, graças a células adultas reprogramadas para assumir um estado muito versátil, semelhante ao embrionário.
O feito, obra de uma equipe japonesa, inclui um esquema para evitar que essas células saiam do controle, um dos grandes temores que ainda cercam o emprego terapêutico delas em pessoas.
Antes de usar determinado grupo de células para tratar os camundongos paraplégicos, os cientistas verificaram se elas levavam à formação de tumores em outros bichos (veja quadro à direita).
As que não produziram cânceres tiveram sucesso em recuperar a lesão na coluna das cobaias, relata a equipe na edição desta semana da revista científica "PNAS".
Um dos autores da pesquisa, Shinya Yamanaka, é o pioneiro no estudo das chamadas células-tronco pluripotentes induzidas (ou células iPS, para encurtar).
Yamanaka e companhia têm mostrado que qualquer célula do corpo adulto pode ser forçada a adquirir uma "síndrome de Peter Pan", voltando à condição polivalente que tinha no início do desenvolvimento.
Seria possível usar uma amostra de pele de um tetraplégico e "convencer" algumas das células nessa amostra a se tornarem pluripotentes, ou seja, capazes de assumir a função de qualquer tecido. Inclusive a do tecido nervoso destruído na lesão que paralisou a pessoa.
Assim, o paciente ganharia um transplante sem risco de rejeição, já que as células vieram do organismo dele. O plano soa perfeito, mas a transformação das células envolve a ativação de genes que, dependendo da situação, podem levar à indesejada formação de tumores.
Para evitar isso, os cientistas primeiro produziram células iPS e depois usaram-nas para criar neuroesferas, agregados de vários tipos de células do sistema nervoso.
"Eles ainda desfizeram essa primeira neuroesfera e criaram uma segunda, o que diminui a chance de sobrar alguma célula indiferenciada [em estado "genérico'] que pudesse levar a tumores", explica o biólogo Stevens Rehen, especialista em iPS da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Finalizando o processo, as neuroesferas foram implantadas no cérebro de camundongos, e os cientistas esperaram para ver quais grupos de células produziam tumores nos camundongos.
Sabendo disso, os japoneses testaram os dois tipos de célula nas cobaias com lesões: as que produziam tumores e as que não os geravam. Como esperado, só o segundo tipo fez os bichos ficarem em pé de novo.
"É uma prova de princípio interessante", diz Rehen. "O problema é que eles esperaram 24 semanas para ver se os tumores apareciam na triagem inicial. É tempo demais, porque a lesão dos pacientes já estaria cicatrizada, dificultando a volta dos movimentos", afirma ele.
Por isso, Yamanaka tem defendido a criação de bancos públicos de células iPS, já testadas. Quando alguém sofresse um acidente, elas poderiam ser usadas com segurança sem muita espera.
(Reinaldo José Lopes - Folha de SP)
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