Estudos feitos pelo Smithsonian Institution, dos EUA, revelam que as tropicais estão crescendo em um ritmo mais lento que o habitual e as temperadas, de forma mais acelerada
As mudanças climáticas já estão causando alterações no padrão de crescimento das florestas - tanto das tropicais quanto das temperadas -, mostram dois estudos realizados pelo Smithsonian Institution, dos Estados Unidos, obtidos pelo Estado.
As alterações no clima têm feito com que as florestas tropicais cresçam em um ritmo mais lento do que o habitual, ao passo que o inverso ocorre nas florestas temperadas, onde as árvores se desenvolvem a taxas mais aceleradas. Em ambos os casos, o fenômeno pode ser explicado pelo aumento nas concentrações de CO2 na atmosfera.
Nos últimos 40 anos verificamos um aumento de 15% nas emissões de CO2 na atmosfera. Era esperado que isso afetasse os padrões de crescimento das florestas, mas só agora estamos tendo as primeiras pistas de como isso está acontecendo na prática", afirma o pesquisador Stuart James Davies, diretor científico do Smithsonian Tropical Research Institute, considerada uma das principais instituições mundiais de estudos na área de ecologia tropical, com atuação em 40 países.
Após realizar estudos de campo em florestas de área superior a 50 hectares (o equivalente a 50 campos de futebol), localizadas na Ilha Barro Colorado, no Panamá, e em Pasoh, na Malásia, Davies e sua equipe concluíram que as florestas tropicais estão registrando as menores taxas de crescimento dos últimos 21 anos. Foram analisadas mais de 400 mil árvores e arbustos, marcados e catalogados ao longo de 30 anos.
Segundo a pesquisa, as taxas de crescimento dos troncos caíram significativamente nas duas florestas. No Panamá, várias amostras foram analisadas. Em um grupo de 242 espécies, os padrões de crescimento se alteraram em 95% delas, sendo que em 71% as mudanças foram bastante significativas. Na Malásia, de um grupo de 775 espécies de árvores, 95% apresentaram taxas de crescimento inferior às verificadas nos últimos 20 anos.
Nos dois casos, explica Davies, as alterações no padrão de crescimento estão associadas a mudanças nos regimes climático locais. Entre elas, a redução da média anual de temperaturas mínimas e aos níveis de chuvas.
"As causas dessa redução no crescimento das árvores ainda precisam ser melhor compreendidas. Mas há uma nova dinâmica em curso, claramente um sinal das mudanças climáticas." O estudo faz parte do projeto HSBC Climate Partnership, criado pelo grupo financeiro britânico com o objetivo de conduzir experiências de campo sobre os efeitos das mudanças climáticas sobre os ecossistemas e, a longo prazo, também na economia.
Florestas temperadas. As florestas localizadas em regiões de clima temperado - como nos Estados Unidos e Europa - também estão tendo seus padrões de crescimento alterados, mas no sentido contrário.
Essas florestas crescem a taxas aceleradas, nunca vistas nos últimos 225 anos, aponta outro estudo, realizado pelo Smithsonian Environmental Research Center, que também faz parte do Smithsonian Institution.
Experimento desenvolvido em florestas do Estado americano de Maryland pelo ecólogo Geoffrey Parker foi publicado em fevereiro pela Proceedings of The National Academy of Sciences (PNAS), a publicação da Academia Nacional de Ciências dos EUA.
Parker rastreou as taxas de crescimento das árvores com idades entre 5 anos e 225 anos e as incluiu em um modelo matemático. Mais de 90% das amostras cresceram entre duas a quatro vezes mais rápido que o padrão delimitado pelo modelo matemático. Na floresta que serviu de base para o estudo, as taxas de CO2 na atmosfera cresceram 12% nos últimos 22 anos e a estação mais quente, onde ocorre majoritariamente o crescimento das árvores, se prolongou por mais sete a oito dias por ano.
"Se olharmos para os resultados dos dois estudos é possível concluir que a resposta das florestas às mudanças climáticas é rápida", diz Davies. O pesquisador explica que essas mudanças, associadas às alterações drásticas nas paisagens causadas pela ocupação humana - como desmatamentos e queimadas - podem trazer impactos importantes na regulação do clima e do regime de chuvas, especialmente nas regiões tropicais.
No Brasil, o Experimento de Grande Escala da Interação Biosfera-Atmosfera da Amazônia (LBA), iniciativa que soma mais de 150 projetos de pesquisas, ainda não possibilitou aferir conclusões sobre como o bioma é afetado pelo aquecimento global.
"Ainda não temos dados suficientes para afirmar que a floresta tropical brasileira teve seus padrões de crescimento alterados em razão das mudanças climáticas", afirma Luiz Antonio Martinelli, pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP). Ele explica que as florestas tropicais têm maior variabilidade genética e possibilidade de adaptação a mudanças do que as florestas de clima temperado. "Mas já temos um banco de dados consistente para investigações futuras."
''Menor expansão das árvores é negativa para a humanidade'', entrevista com Stuart J. Davies, diretor do Smithsonian Tropical Research Institute
O pesquisador Stuart James Davies, diretor científico do Smithsonian Tropical Research Institute e Ph.D. pelo Departamento de Biologia Evolucionária pela Universidade de Harvard, esteve no Brasil este mês para apresentar seu estudo sobre biomassa florestal em um evento em Manaus. Após a apresentação de seus estudos, ele falou ao Estado.
- O que está acontecendo com as florestas tropicais?
Venho estudando a variação geográfica, a sazonalidade das chuvas, a disponibilidade de recursos de solo e as mudanças nos padrões climáticos. É preciso compreender como os fatores ambientais influenciam as taxas de crescimento e de mortalidade de algumas espécies. Isso é fundamental para prever os possíveis impactos das mudanças no uso do solo e as condições globais das florestas tropicais. Pelos estudos de campo realizados no Panamá e na Malásia, podemos concluir que já existe uma resposta das espécies tropicais às mudanças climáticas.
- Que reflexos essa tendência pode trazer para questões como regulação do clima e o regime de chuvas?
Ainda é cedo para dizer quais são as alterações que essa mudança no padrão de crescimento das florestas trará no longo prazo. Isso precisa ser melhor estudado. Mas o que ocorre é que, em paralelo a essas alterações biológicas, existem as mudanças no uso da terra, causadas pelo homem. Estamos vendo uma perda de espécies provocada pelo desmatamento e a conversão de terras em agricultura. As duas coisas, somadas, terão influência significativa na regulação do clima nas áreas tropicais, especialmente no regime de chuvas.
- A tendência é irreversível?
Não, as tendências de crescimento das florestas podem variar, dependendo das condições ambientais. Se as concentrações de CO2 na atmosfera continuarem a aumentar, então as árvores podem começar a consumir mais carbono e crescer mais rapidamente. Mas, se a temperatura se elevar conforme preveem os cientistas do clima, esse crescimento poderá não acontecer.
- O que mais entra nessa equação?
No futuro, o efeito do CO2 adicional dependerá do que acontecer com as temperaturas e as chuvas. Se houver mais secas, por exemplo, as árvores tenderão a desacelerar ainda mais seu crescimento ou a ter taxas maiores de mortalidade. Isso seria péssimo porque essas florestas perderiam parte de seu potencial de absorver o carbono lançado na atmosfera pela queima dos combustíveis fósseis e outras atividades humanas. Se as árvores crescem a taxas menores, a concentração de CO2 na atmosfera pode aumentar. Isso é negativo para a humanidade. Mais CO2 significa mais aquecimento global.
(Andréa Valli -O Estado de SP)
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