‘Bioinvasão’ trazida por navios desafia cientistas brasileiros

Enquanto olhos do mundo todo se voltam para o derramamento de petróleo no Golfo do México, uma lenta “poluição” invade silenciosamente ambientes costeiros. São diversos seres, entre eles algas, crustáceos e moluscos, carregados na água dos porões dos navios e que podem causar desastres ambientais quando chegam em portos estrangeiros, onde muitas vezes não encontram predadores naturais e se alastram.

Durante a reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que ocorre nesta semana em Natal, cientistas que estudam o mar explicaram que ainda não há solução definitiva para esse problema, e que o Brasil tem vários exemplos de animais que já causaram transtornos ambientais.

A água, em geral captada nos portos onde os navios saem, é utilizada pelas embarcações para dar equilíbrio quando a viagem é feita sem carga. Ao chegar ao porto de destino, a chamada “água de lastro” é liberada, causando uma migração involuntária de milhões de seres vivos.

“O mundo inteiro está preocupado com esse problema, e ainda não há nenhum método eficaz para combatê-lo”, afirma a bióloga Rosa Luz de Souza , pesquisadora de Universidade Federal Fluminense (UFF) e organizadora do livro “Água de lastro e bioinvasão”.

Segundo a bióloga, um dos piores exemplos de espécie exótica que se alastrou pelo Brasil foi o mexilhão dourado. Ele veio da Ásia nos porões dos navios e se tornou uma praga nos rios brasileiros, chegando até o Pantanal. O animal se espalhou com tanto vigor que agora causa problema para as usinas hidrelétricas, pois se incrusta nos equipamentos e atrapalha a passagem da água.

O cientista Marco Cutrim, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), explica que os pesquisadores têm dificuldade para criar mecanismos que controlem esses seres depois que eles foram soltos na natureza, e aponta que faltam pesquisas sobre a biologia marinha. “No Nordeste no Norte nós não conhecemos nem a nossa biota [conjunto de seres que habitam um ambiente].”

Troca de água – No Brasil, a Marinha exige a troca da água de lastro em mar aberto antes que os navios cheguem aos portos. Há também normas específicas para o Rio Amazonas, para que embarcações não soltem água salgada em portos fluviais.

Segundo Flávio da Costa Fernando, pesquisador do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira, ligado à Marinha, a substituição da água resolve parte do problema, mas não é totalmente eficaz, já que os navios não foram construídos para isso, e microorganismos invasores podem permanecer nos porões durante a troca.

O pesquisador explica que já foram feitas experiências com substâncias químicas para tratar a água, mas esses elementos podem matar os organismos nativos dos portos quando a água for desembarcada.

Convenção internacional – A grande esperança, segundo ele, é a implantação da Convenção Internacional para Controle e Gestão da Água de Lastro e Sedimentos de Navios. Aprovada pela Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla em inglês) em 2004, ela não foi posta em prática ainda porque precisa da assinatura de 30 países, mas até agora conseguiu aprovação de 26, entre eles o Brasil.

“A convenção exige uma densidade máxima de organismos [na água de lastro]”, informa Fernandes. Segundo o pesquisador, para eliminar os seres vivos estão sendo desenvolvidos sistemas de tratamento, que ainda passarão pela aprovação da IMO.

(Fonte: Iberê Thenório/ G1)

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