Brasileira participa de descoberta de água congelada em asteroide e reforça hipótese de que conteúdo dos oceanos terrestres veio do espaço
Água congelada foi detectada pela primeira vez num asteroide, um tipo de corpo celeste que costuma ser descrito como uma rocha espacial extremamente seca. E não se trata da presença esparsa de gelo na superfície do astro. Segundo dois estudos feitos por duas equipes internacionais que trabalharam de forma independepente e publicam seus trabalhos simultaneamente na edição desta semana da revista britânica Nature, o asteroide 24 Themis, que mede cerca de 200 quiômetros de diâmetro e fica a meio caminho entre Marte e Júpiter, é todo coberto por uma fina camada de gelo e também apresenta sinais da existência de moléculas orgânicas.
"Não é possível saber com certeza qual é a espessura do gelo", afirma a astrofísica brasileira Thais Mothé Diniz, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coautora de um dos estudos, do artigo redigido pela equipe de Humberto Campins, da Universidade da Flórida Central. "Mas ela deve ter entre alguns centímetros e uns poucos metros". A descoberta reforça a teoria de que a água dos oceanos e o material carbonáceo da Terra, dois pré-requisitos fundamentais para a geração da vida, podem ter vindo de cometas e talvez de asteroides como o 24 Themis, que se chocaram com o nosso planeta durante o processo de formação do sistema solar.
Asteroides não emitem sua própria luz. Por isso, ambos os times de astrofísicos tiveram que contar com os serviços do telescópio infravermelho da Nasa instalado em Mauna Kea, no Havaí, para levantar indícios indiretos da presença de água nesse objeto celeste. Com a ajuda do aparelho, eles estudaram a luz do Sol refletida pela superfície do 24 Themis em comprimentos de onda do infravermelho situados entre 2 e 4 micrômetros. As análises da espectrometria das duas equipes chegaram basicamente à mesma conclusão: o asteroide deve ser revestido por uma delgada capa de gelo, misturada com moléculas orgânicas. "24 Themis mantém essa capa de gelo provavelmente desde que a Terra se formou, há cerca de 4,5 bilhões de anos", diz Thais, que é especialista em asteroides.
Os pesquisadores especulam que o asteroide deve ter um reservatório de água escondido em seu interior, metros abaixo da superfície, que fornece com regularidade a matéria-prima para que haja permanentemente gelo em volta de sua crosta. Vapor d'água escaparia desse reservatório subterrâneo e migraria para a superfície do asteroide, onde parte dele daria origem à perene camada gelo. Se isso não ocorresse, dizem os cientistas, a presença ali de água congelada deveria ser forçosamente efêmera. A temperatura média de 24 Themis é de cerca de 200 K (-73°C). Nesse cenário, água congelada num corpo celeste situado à mesma distância do Sol em que está o asteroide descrito nos papers da Nature simplesmente sublima depois de algum tempo — vira vapor sem passar pela fase líquida.
Na verdade, nunca se duvidou de que os asteroides tenham tido, em algum momento de seu passado remoto, gelo. Mas se acreditava que hoje não seria mais possível encontrar uma astro dessa classe com esse perfil (todo o gelo já teria sublimado). Afinal, hoje a presença de gelo está associada a cometas, e não a asteroides. Mas essa ideia vem sendo questionada recentemente e talvez o conceito que separe um cometa de um asteroide já não seja mais tão rígido como antigamente.
Antes de se achar a camada de gelo em 24 Themis, astrofísicos já haviam obtido pistas de que outros dois asteroides apresentavam uma pequena quantidade de gelo sublimado em sua superfície. "Asteroides são geralmente vistos como sendo muito secos", diz o astrofísico Joshua Emery, da Universidade do Tennessee, principal autor do segundo artigo científico sobre 24 Themis. "Parece agora que, quando os asteroides e os planetas estavam se formando nos primórdios do sistema solar, a presença de gelo se estendia para dentro da área do cinturão de asteroides". Um dos desafios dos astrofísicos agora é descobrir se 24 Themis é apenas uma exceção à regra ou há outros asteroides de perfil semelhante.
Fasesp
0 Comentários
Olá, agradecemos sua visita. Abraço.