Um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) comprovou a eficácia do uso de uma substância derivada de planta, a ibogaína, no tratamento da dependência química.
A equipe, liderada pelo psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, testou a estratégia em 75 pacientes com dependência química que, além de receberem a substância, também se submeteram a sessões de psicoterapia. Ao final de um ano, 72% permaneciam longe das drogas.
O estudo foi publicado no fim de setembro na revista britânica “Journal of Psychopharmacology”.
A ibogaína é derivada da raiz da planta iboga, nativa do Gabão, na África. De acordo com o médico Bruno Rasmussen Chaves, um dos autores do estudo, a substância estimula a produção do hormônio GDNF, que por sua vez estimula as conexões entre os neurônios e promove um equilíbrio dos neurotransmissores.
“O uso de drogas altera o funcionamento dessas conexões entre os neurônios, as sinapses, desequilibrando as proporções entre os neurotransmissores. A ibogaína coloca o cérebro do paciente em um estado muito semelhante de equilíbrio e funcionamento de quando nasceu. Ele volta a ter o mesmo padrão que tinha antes das drogas”, diz.
Segundo o especialista, esse reequilíbrio promove um bem-estar físico e mental, que leva o paciente a ficar mais consciente de si mesmo. Esse processo facilita o trabalho do terapeuta e faz com que o paciente tenha maior aderência à terapia. Para obter esse efeito, a recomendação é que o paciente receba uma dose única da substância.
Entenda o estudo – O estudo foi feito com 75 usuários de drogas que consumiam principalmente cocaína e crack, mas alguns usavam também álcool e maconha.
Ao todo, havia 8 mulheres e 64 homens. A princípio, eles foram submetidos a um tempo variável de psicoterapia e a exames para verificar se seu organismo estava com condições propícias para receber o medicamento à base de ibogaína. “Encaramos esse tratamento como uma pequena cirurgia. É uma coisas simples, mas não se pode fazer em uma pessoa com diabetes desequilibrada ou pressão descontrolada”, diz Chaves.
Para receber o medicamento, por via oral, eles ficaram internados por um período de 24 a 48 horas. “Nesse período, eles ficam deitados sob o efeito da medicação. Há algumas reações como tontura, náusea, vômito, tremor e um estado de confusão mental. Nesse momento, o paciente fica em um estado intermediário entre vigília e sonho”, explica Chaves.
Depois do período de internação, os pacientes iam para casa e ficavam em acompanhamento psicológico e psiquiátrico por tempo variável. Depois de um ano, 72% dos pacientes estavam abstinentes. Entre as mulheres, o índice de sucesso foi de 100% e, entre os homens, foi de 55%.
“Isso não quer dizer que a estratégia seja muito melhor em mulheres do que homens. O grupo de mulheres era muito pequeno e, por uma coincidência feliz, todas se desenvolveram muito bem. Mas mesmo entre os homens, o índice de sucesso ainda foi 5 vezes maior do que o tratamento tradicional, só com psicoterapia”, diz o médico.
Ele observa que não é um tratamento para qualquer um, “mas para pacientes muito graves, que não responderam a outros tratamentos anteriormente e já passaram por inúmeras internações”. Segundo ele, não há risco de a ibogaína promover dependência, pois ela não tem potencial recreativo: a experiência de consumi-la é extremamente desconfortável.
O medicamento usado no estudo é produzido no Canadá, onde a ibogaína é aprovada e usada em tratamentos contra dependência química. No Brasil, não há uma regra que regulamente a substância, mas, caso ela seja receitada por um médico, pode ser importada.
(Fonte: G1)