Especialistas criticam relação de oito remédios a base de plantas sugerida ao SUS, apontando que houve inclusão de laxante que não traz benefício e ausência de produtos com ação comprovada contra a depressão; ministério diz que críticas são pontuais
O governo federal promete revisar e ampliar a lista de fitoterápicos recomendados para o Sistema Único de Saúde (SUS), em meio a críticas de que parte do rol de oito plantas já incluídas não traz benefícios e não valoriza a flora nacional. Além disso, pesquisadores apontam a falta de fitoterápicos de ação comprovada contra depressão e ansiedade, que não trazem o risco de dependência - como ocorre com as drogas tradicionais.
Segundo o diretor de assistência farmacêutica do Ministério da Saúde, José Miguel do Nascimento Júnior, uma comissão vai preparar uma relação nacional de medicamentos fitoterápicos essenciais, que ampliará o total ofertado no sistema público e poderá revisar o rol atual. A lista havia sido alterada pela pasta de dois para oito produtos no fim do ano passado.
"A comissão vai estudar e é óbvio que, se entender que são necessárias adequações, isso vai ser corrigido. Mas todas as plantas que estão lá têm uso, eficácia e segurança comprovados", afirmou ao Estado o diretor, que diz que as críticas são pontuais.
Para o farmacêutico Luis Marques, vice-presidente da Federação Brasileira das Associações para o Estudo das Plantas Medicinais (Febraplame), no entanto, a seleção das plantas foi feita de maneira "irresponsável". Ele questiona, por exemplo, a inclusão da cáscara sagrada, planta importada dos EUA, indicada para constipação leve. A planta é um laxante, irritante intestinal, que pode causar dependência e mascarar outros problemas no órgão. "Do ponto de vista terapêutico, é contraindicado", afirma.
Roberto Boorhem, presidente da Associação Brasileira de Fitoterápicos (Abfito), diz que a constipação tem de ser corrigida com alimentação rica em fibras. Para ele, o fato de o governo ter incluído fitoterápicos no SUS representa um avanço, mas os critérios usados na escolha dos produtos são questionáveis.
Dependência
A Abfito destaca que não foram contemplados no SUS fitoterápicos de ação antidepressiva comprovada e que não causam dependência, como o ipérico (ou erva-de-são-joão), usado em remédios existentes no mercado, além de outras espécies como a macela, a passiflora e a melissa, base de produtos contra ansiedade e insônia também disponíveis nas farmácias.
No caso da isoflavona, uma das oito incluídas na lista do SUS, não há fornecedores do extrato no País, apesar de o Brasil ser o maior produtor de soja do mundo. O produto é todo importado de Israel, segundo Marques. A alcachofra, apesar de cultivada no Brasil, não é uma espécie nativa. E a aroeira, indicada para problemas ginecológicos, favoreceu um único produto existente no mercado. "Não combina com uma política pública", diz o pesquisador.
Segundo Marques, há problemas também na escolha das 71 espécies da Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse ao SUS (Renisus), que serve como referência para investimentos na pesquisa de plantas que poderão, eventualmente, ser incorporadas à rede pública (como já foi feito com as oito atuais). "Ninguém sabe como essa lista foi feita, qual foi o critério utilizado, se foi científico, se foi político", diz o pesquisador.
A relação, segundo ele, mistura plantas estrangeiras e brasileiras, espécies já comerciais com outras pouco conhecidas ou até não identificadas. Um nome que chama a atenção é o da Jatropha gossypiifolia, uma planta tóxica usada para produção de biodiesel, sem aplicação médica conhecida. "É muito importante que tenhamos uma lista. Mas é preciso ter critérios."
Nascimento Júnior, do ministério, rebate as críticas. Diz que houve ampla discussão com a sociedade, incluindo universidades e secretarias de Saúde. "Há duas formas de fazer as coisas: uma é esperar que tudo seja resolvido e em um tempo muito além das metas. A outra é fazer", afirmou.
"Não fizemos nada a portas fechadas", ressaltou. "Agora poderemos ter uma relação definitiva, mas que depois também terá de ser revisada a cada dois anos, como já ocorre com a relação de medicamentos sintéticos. Isso é normal."
(Herton Escobar e Fabiane Leite - O Estado de SP)
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