Descoberta de gelo e de compostos orgânicos em asteroide reforça a teoria de que os oceanos se formaram a partir do choque de corpos espaciais com a Terra
Quando a Terra foi formada, há cerca de 4,5 bilhões de anos, sua temperatura era muito alta para que abrigasse água. O planeta só começaria a se tornar azul mais tarde, com a diminuição do calor. Mas de onde teria vindo a água que formou os oceanos e permitiu a existência de vida? Uma das teorias - considerada bastante plausível por um grande número de cientistas - diz que o líquido surgiu, pelo menos em parte, a partir da queda na superfície terrestre de meteoros e asteroides cobertos de gelo.
Até a semana passada, essa era uma ideia que precisava de evidências mais consistentes. Daí a importância de dois estudos publicados simultaneamente na revista especializada Nature, realizados por grupos de cientistas de diversos países, incluindo o Brasil. As duas pesquisas constataram evidências de gelo e material orgânico (no caso, hidrocarbonetos) no 24 Themis, um dos maiores corpos que compõem o cinturão de asteroides localizado entre Marte e Júpiter.
"Essa descoberta é muito importante, pois reforça a teoria de que a água dos oceanos e o material orgânico encontrado, dois pré-requisitos fundamentais para a geração da vida, podem ter vindo de cometas e, talvez, de asteroides", explica ao Correio Thais Mothé Diniz, pesquisadora do Observatório de Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ela é única brasileira participante de um dos estudos, coordenado pelo norte-americano Humberto Campins, da Universidade da Flórida Central.
Em outras palavras, a descoberta colocou o homem mais perto de entender um evento fundamental para a sua própria existência: o início das condições propícias ao desenvolvimento da vida na Terra. Segundo o professor do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Alvaro Crósta, a Terra vem sofrendo bombardeios realizados por asteroides desde a sua criação. "Portanto, a hipótese de que a água teria sido trazida de fora e introduzida na Terra por asteroides em um período intermediário da história do planeta, quando as condições já permitiam a existência de água, é plausível. Faltava constatar a ocorrência de água em asteroides, o que foi conseguido agora", afirma.
Para chegar a essa conclusão, os dois grupos de cientistas contaram com a ajuda do telescópio de infravermelho pertencente à Agência Espacial Norte Americana (Nasa), localizado em Mauna Kea, no Havaí. "Com a ajuda do equipamento, conseguimos estudar a luz do Sol refletida pela superfície do 24 Themis", conta Thais.
Joshua Emery, professor da Universidade do Tenessi, nos Estados Unidos, - integrante da equipe que realizou a outra pesquisa que chegou às mesmas conclusões, coordenada por Andrew Rivkin, da Universidade Johns Hopkins, também nos EUA - explica que a necessidade de utilizar um telescópio de infravermelho se deve ao fato de os asteroides não emitirem luz própria. "Esses corpos refletem cerca de 5% da luz que atinge sua superfície. Essa reflexividade é semelhante à do carvão. Aos nossos olhos, o 24 Themis parece muito escuro", conta, por e-mail.
De acordo com ele, o telescópio possui um espelho primário de 3m de diâmetro e um espectrógrafo (equipamento que realiza um registro fotográfico de um espectro luminoso) ligado a ele. "O espectrógrafo tem a luz coletada pelo telescópio e a divide em diferentes comprimentos de onda (cores). Em seguida, é medido o brilho da luz em cada comprimento. Nesse caso, estávamos procurando a parte infravermelha do espectro de luz solar refletida da superfície do asteroide", enfatiza.
Próximos passos
Alguns estudos, porém, ainda são necessários. Segundo Humberto Campins, não foi possível precisar a quantidade de água congelada na superfície do 24 Themis. "Estamos estudando outros membros da mesma família de asteroides e também outros candidatos que possam conter gelo e material orgânico", revela o pesquisador da Universidade da Flórida Central, em entrevista por e-mail.
Apesar de não saberem ao certo a quantidade de água na superfície, os cientistas especulam sobre a existência de um reservatório escondido no interior do asteroide. "Ele forneceria com regularidade a matéria-prima para a formação da crosta de gelo", diz Thais.
(Gisela Cabral - Correio Braziliense)
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