Brasileiro faz música em dueto com fungo

Um músico brasileiro apresentou na Grã-Bretanha um dueto inédito: no piano, ele interagiu com um fungo. E mofo toca música? Nas mãos de Eduardo Miranda, sim.


Especialista em música computadorizada, ele transformou a decomposição em composição: seu novo trabalho usa culturas do fungo Physarum polycephalum como um componente central de um biocomputador interativo, que recebe sinais de som e envia de volta as respostas.

“A composição, Biocomputer Music, se desenvolve como uma interação entre mim e a máquina Physarum,” disse Miranda.

“Eu toco alguma coisa, o sistema escuta, toca alguma coisa de volta, e então eu respondo, e assim por diante.”

Brasileiro de Porto Alegre, Miranda leciona na Universidade de Plymouth, na Inglaterra.

Ele disse à BBC Brasil que Heitor Villa-Lobos tem uma grande inflluência em sua obra e que gostaria de levar a apresentação Biocomputer para o Brasil, mas que, por enquanto, questões técnicas impedem que ele viaje com o equipamento.

Funcionamento – O mofo Physarum forma um componente eletrônico vivo e mutante em um circuito que processa sons captados por um microfone treinado no piano.

Pequenos tubos formados pelo Physarum têm a propriedade elétrica de agir como uma resistência variável que muda de acordo com tensões aplicadas anteriormente, de acordo com Ed Braund, aluno de doutorado no Centro Interdisciplinar de Computer Music Research na Universidade de Plymouth.

“As notas de piano são transformadas em uma onda elétrica complexa que enviamos através de um desses túbulos Physarum. A resistência Physarum muda em função das entradas anteriores, e as notas musicais viram, então, uma nova saída que é então enviada de volta para o piano. O biocomputador atua como um dispositivo de memória”, acrescenta Miranda.

“Quando você diz a ele para tocar novamente, ele vai embaralhar as notas enviadas. Pode até gerar alguns sons que não estavam nas notas tocadas. A máquina tem um pouco de ‘criatividade’.”

Enquanto o pianista toca piano na forma convencional, utilizando as teclas, o biocomputador induz notas por pequenos eletroímãs que pairam milímetros acima das cordas de metal, imbuindo a música com um tom etéreo.

Acaso – Miranda compara seu uso de um biocomputador às técnicas “aleatórias” do compositor de vanguarda americano John Cage (1912-1992), que se voltou para o livro chinês de mudanças i-ching e ao lançamento de dados para controlar partes de suas composições.

“John Cage acreditava no acaso, mas não na aleatoriedade. Ele queria aproveitar a estrutura que estava fora de seu controle. Aqui nós temos o efeito, programado em uma máquina viva. Eu acho que isso é o sonho de John Cage realizado.”

Miranda vem explorando há algum tempo o uso de computadores em peças interativas de composições eletrônicas, mas valoriza a simplicidade do processador Physarum.

“O que eu ouço é muito diferente de ter um computador digital programado com cadeias de dados. Não é inteligente, mas é vivo. O que é interessante…”

A estreia de Biocomputer Music ocorreu no Peninsular Arts Contemporary Music Festival “Biomusic” no dia 1º de março. 

(Fonte: G1)