Florestas e parques são a mesma coisa?

A recente crise econômica que se instalou na Europa abateu primeiro Grécia e Irlanda.

Logo depois atingiu Portugal. Em terras lusas chegou com força, derrubou o Governo socialista e obrigou a administração do país a fechar um acordo de austeridade fiscal e financeira muito rigoroso com a tróica formada pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco Central Europeu e pela Comissão Europeia, para fiscalizar os empréstimos concedidos a Lisboa.

O acordo, reclamam alguns portugueses, é draconiano. Inclui a redução de salários e do 13º do funcionalismo, a demissão de funcionários temporários, o aumento de impostos, o corte nos gastos públicos e a fusão, a venda ou a extinção de muitas autarquias e repartições governamentais.

Florestas Nacionais são anunciadas com placas de azulejo. Crédito: Pedro da Cunha e Menezes

No bojo dessa última medida, o Governo português recentemete sugeriu reunir o Instituto português da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICN) com a Autoridade Florestal Nacional. O raciocínio é que juntos os órgãos custarão menos aos cofres públicos, pois haverá racionalização de gastos e uso compartilhado de equipamentos.

A medida vem justamente no momento em que o Brasil trilha o caminho inverso, separando cada vez mais o Instituto Chico Mendes do Serviço Florestal Brasileiro. Quem está com a razão, nós ou eles?

Em princípio, unidades de conservação de uso direto e de uso indireto podem ser bem geridas dentro de um mesmo órgão, como é o caso da África do Sul. Entretanto, a vasta maioria dos países que manejam bem suas áreas protegidas, tanto ricos como pobres, têm optado por separar aquelas que têm características extrativistas das de proteção integral. Para citar alguns exemplos que tive a oportunidade de estudar de perto, é assim na Austrália, na Namíbia e em Portugal. Nos Estados Unidos e no Quênia os dois grupos de unidades de conservação não pertencem sequer ao mesmo Ministério.

"Cabe ao Ministério, e não ao IBAMA nem ao Instituto Chico Mendes, dar o rumo da política ambiental brasileira e, por conseguinte, zelar para que suas autarquias a implementem de forma coordenada e em sintonia."

As atividades de gestão atinentes aos dois grupos são bem distintas. O Grupo extrativista para atingir seus objetivos tem por imperativo o aproveitamento econômico dos recursos ambientais. Seu manejo deve ter um norte sócio-econômico. Tal não é o caso das UCs de proteção integral, onde o principal objetivo não é econômico mas de conservação da biodiversidade. Têm como objetivo secundário proporcionar oportunidades de recreação para a população. Ora, embora os dois grupos façam parte de um mesmo sistema –que no Brasil é o SNUC- são regidos por paradigmas diferentes, têm lógicas administrativas diversas e, por conseguinte, exigem profissionais com treinamentos específicos e díspares.

No Brasil, ambos os modelos já fizeram sentido. Inicialmente, quando da criação do IBAMA não havia um Ministério do Meio Ambiente. Era então aconselhável que o novo órgão tivesse musculatura suficiente para ser capaz de enfrentar os desafios da gestão ambiental,com densidade que o capacitasse a peitar ministérios da área da infraestrutura, mas que fosse também forte o bastante para ser um formulador relevante da política ambiental brasileira. Essa realidade temporal justificou a reunião em só órgão de setores outrossim díspares como a Superintendência de Desenvolvimento da Pesca, a Superintendência da Borracha, o IBDF e a SEMA.

Parques pedem sinalização com educação ambiental. Crédito: Pedro Cunha e Menezes

O modelo cumpriu seu objetivo, mas começou a ser anacrônico após a criação do Ministério do Meio Ambiente. Com efeito, a partir daí toda a formulação de políticas deveria ter ido para o Ministério, que é a instância representativa da vontade do povo, através do voto concedido ao Governo do dia, cabendo ao IBAMA somente a execução dessas mesmas políticas. Mas o uso do cachimbo entorta a boca e o tamanho e orçamento do órgão, desproporcionalmente maiores do que os do Ministério ao qual está subordinado, criaram uma competição pela formulação, prejudicial à área ambiental no Brasil.

Cabe ao Ministério, e não ao IBAMA nem ao Instituto Chico Mendes, dar o rumo da política ambiental brasileira e, por conseguinte, zelar para que suas autarquias a implementem de forma coordenada e em sintonia. As autarquias, por sua vez, devem ter corpos de funcionários cada vez mais profissionalizados (evitando-se a ocupação exagerada de cargos em DAS por funcionários extra-quadro) e focados na atividade fim, qual seja a implementação das políticas emanadas do MMA. Cabe sim às autarquias suprirem o MMA com subsídios e opiniões acerca de tais políticas, inclusive com a cessão de servidores, mas nunca a usurpação da prerrogativa.

No caso Português, a discrepância é ainda maior. No Brasil, substancial parte das Florestas é de mata nativa, o que lhes confere grande importância como repositórios de biodiversidade. No caso de nosso irmão d´além mar, a mesma máxima não é verdadeira. Ali a maioria da florestas é constituída por eucaliptais e pinheirais e têm grande importância como geradores de emprego e renda para o país. Colocar sua gestão sob a mesma égide, movido pela pressão da Tróica para enxugar as finanças do Estado, embute o risco de drenar recursos da proteção e gestão ambiental (que não dá lucro) para adubar a atividade florestal, buscando assim melhorar o desempenho da economia como um todo.

O barato arrisca sair caro...

Parques servem para proteger a biodiversidade
(Oeco)

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